quarta-feira, 2 de setembro de 2020

Artistas e professora de arte de Itaguaí opinam sobre a obra de Romero Britto


Pernambucano famoso, em evidência por causa de incidente na sua galeria, entra na berlinda

ITAGUAÍ - A recente cena que viralizou na internet – uma ex-fã que, em protesto, jogou ao chão uma escultura do artista brasileiro radicado em Miami, Romero Britto – deu o que falar também entre os artistas de Itaguaí. Manoel Ribeiro, Dhy Carvalho e Mariana Fernandes – três conhecidos artistas da cidade – comentam o que acham do trabalho do pernambucano famoso.

A professora de artes Andréa Alves, que atua em Itaguaí, lembra que a discussão em torno de Britto e da validade artística das suas obras não é de hoje, ela existe desde que o trabalho dele começou a se popularizar. “Uma coisa é certa: Romero Brito divide muitas opiniões, desde renomados críticos de arte ao grande público, que muitas vezes, não têm muito acesso a expressões artísticas distintas” – explica ela.

No mercado, a obra de Britto é extremamente valorizada: ele já vendeu mais de 60 instalações públicas pelo mundo, tem seus quadros comercializados em mais de 70 países e, em 2015, estimou-se que seu faturamento foi de 80 milhões de dólares em um ano. Sua relação com celebridades da música, cinema, TV e políticos contribui ainda mais para a sua popularidade.

Mas há críticas das pessoas do ramo e de estudiosos. Eles denunciam a superficialidade, a monotonia (tudo muito parecido), o exagero nos preços e a facilidade de reprodução como alguns dos elementos condenáveis na obra de Britto.

Estimulados a darem uma opinião, confira o que artistas de Itaguaí e a professora Andréa disseram.

MANOEL RIBEIRO

Para Manoel Ribeiro, falta profundidade na obra de Romero, que é seu conterrâneo - Arquivo pessoal

"Podemos denominar a 'arte' no passar do tempo a partir das vivências. Como a arte que ele desenvolve é seguida de um pensamento comercial, para mim os traços de cores saturadas acontecem na composição de modo muito simplificado. Isto lembra o movimento Pop Art que surgiu nos EUA. Não é conveniente amarrar o artista numa só direção, definindo-o em um estilo, já que ele vive fases. O tempo dirá se os trabalhos do Romero Britto vão se adequar a um projeto artístico visual ou não e também se eles sobrevivem ao longo do tempo, pois muitas produções no mercado da arte são efêmeras. Na minha concepção, a arte de Romero Britto é rasa, sem ter um conteúdo mais aprofundado que possa permitir a construção de um legado. Mas o trabalho dele, sem dúvida, é um significativo exemplo de marketing".

Manoel Ribeiro nasceu em Limoeiro, Pernambuco. É graduando em Belas Artes pela UFRRJ. Trabalha com escultura , pintura, ilustração e gravura.

DHY CARVALHO

Para Dhy Carvalho, é preciso entender o diálogo entre o mercado e a obra de arte - Arquivo pessoal

"O que o Romero Britto faz não deixa de ser arte: ele lida com meios plásticos (linha e cor), mas o que ele faz se desdobra para as artes gráficas e decorativas, uma proposta que hoje atende às expectativas do mundo do design. Pode-se dizer que as pinturas dele são produtos que atendem às necessidades decorativas. São utilizadas para compor as estampas de objetos de uso cotidiano das pessoas, fruto de um pensamento imediatista do capital. Não é exatamente um erro, mas é preciso entender a realidade do diálogo entre a obra de arte e o mercado de consumo. Romero Britto cai numa perspectiva totalmente ligada aos estereótipos da beleza e despreza o processo de criação. É óbvio que o artista precisa vender e conquistar seu dinheiro, mas é preciso equilíbrio".

Dhy Carvalho é formado em Belas Artes pela UFRRJ, é professor e curador na área de Artes Plásticas, com foco na produção de desenhos e pinturas. Ele também se dedica a projetos de inclusão social de pessoas com deficiência em Itaguaí há oito anos. Atua como curador de exposições individuais e coletivas no projeto ConstruArtes.

MARIANA FERNANDES

Mariana Fernandes vê uma certa infantilidade em Britto - Arquivo pessoal

“Para mim as obras dele têm um ar de infantilidade. É arte sim, até porque ele está envolvido no mercado da arte e sabemos que o mercado artístico hoje visa muito mais o dinheiro do que a bagagem do artista (algo muito triste, mas sempre foi assim). Porém, é preciso respeitar as obras do Romero sem perder o respeito. Não se deve cair na famosa questão do belo e feio por não se sentir familiarizado com as obras que ele produz”.

Mariana Fernandes mora em Seropédica. É pintura, ilustradora e graduanda em Belas Artes pela UFRRJ. Ela participa de ações de Arte-Educação em escolas. Atualmente seu processo de criação foca em pinturas, cujas referências de imagem são as obras do pintor holandês Vincent Van Gogh.

ANDRÉA ALVES

Para a professora Andréa Alves, a obra de Britto não suscita uma leitura crítica ou reflexiva - Arquivo pessoal

“A produção de Romero Brito mostra-se neutra, ou melhor, fraca. Ela não suscita uma leitura crítica ou reflexiva, não parece passar por um processo de criação onde o artista tenha sequer tido um pensamento mais elaborado sobre a sua composição. Não que isso seja um fator primordial: na história da arte, determinados movimentos artísticos trabalhavam com o acaso, com o fato de que o processo de criação era mais relevante do que o resultado, do que a obra em si. Mas não é o que acontece em Romero Brito. Em suas criações não parece existir uma relação entre os elementos formais, cada linha, forma, cor ou padrão geométrico são inseridos de tal maneira que todas as suas obras parecem de fácil execução. Não há, nas obras de Romero Brito, complexidade formal ou espaço para análises iconográficas, já que ele representa figuras simples, de fácil assimilação. Em seus quadros não há profundidade, perspectiva, claro-escuro ou harmonia cromática: são planos sobrepostos ou justapostos, cores que se repetem mais ou menos vezes e linhas pretas grossas, que dividem as figuras em formas geométricas".

A professora acrescenta: "Acredito que a maior problemática que envolve o nome de Romero é o fato de não se reinventar. Há 20 anos que ele faz a mesma coisa e não mostra nada de novo, nenhuma outra fase, optando somente pela reprodução em série de suas obras”.

Andréa Alves é professora de Artes e História da Arte, e trabalha nos ensinos fundamental II e médio no colégio Célula 1 e no Uesf em Itaguaí. É autora de material didático publicado pela Editora Irium.

Via: O Dia

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