Alexandre Damascena tem feito das noites de quarta-feira um programa cultural imperdível
ITAGUAÍ - “As pessoas estão interessadas em ler e escrever”, diz um veterano das artes em Itaguaí, Alexandre Damascena. Ele é logo citado por aqueles que são do ramo: artistas, seres culturais, gente engajada em sintonizar e intensificar as almas. Damascena, além de trazer no próprio sobrenome um aspecto de um dos seus ofícios, pontua a (Damas)cena itaguaiense da cultura com uma série de lives – é o que se pode fazer, hoje – com destaque para a literatura. Ator, professor, diretor de teatro e de espaços culturais, Alexandre também é, antes de tudo, um inquieto. Talvez por isso, e por mais doses de encantamento que transborda as páginas e culmina nos palcos, Alexandre tenha se encantado com outra arte: ele é doutor em Literatura Brasileira pela UFRJ. Esta é a força que o leva durante essa pandemia, há meses, a manter um encontro semanal na internet com grandes autores para deleite de quem assiste.
Damascena é de Santa Cruz, mas Itaguaí acabou virando o seu foco. Com 16 anos, estudou teatro na cidade no Espaço Cultural Aerton Perlingeiro, o que viria a ser o Teatro de Itaguaí. O mergulho no teatro fez com que ele se formasse ator profissional, diretor e professor. Ele fundou dois grupos teatrais: a Companhia do Invisível (Santa Cruz) e a Companhia Casa Verde (Itaguaí).
A ideia surgiu, como surgem as grandes ideias, com simplicidade. Ele conta: “Assim que começou a pandemia comecei fazer lives com alguns amigos atores, entre eles Paulo Betti, Armando Babaioff e Gustavo Falcão, que está fazendo comigo a nova novela da Record, “Gênesis” que ainda não estreou por causa da quarentena. Como tenho visto muita polarização política na internet e brigas, achei que podia fugir um pouco disso e resolvi fazer lives lendo e analisando contos de grandes autores da literatura brasileira”.
Uma das lives sobre obra de Machado de Assis: grandes autores discutidos por professores de literatura, e pessoas podem fazer perguntas - Reprodução internet
Deu certo. E agora muita gente já assumiu que tem um encontro marcado com a literatura na tela do celular ou computador.
PARTILHAR LEITURAS
A literatura ajudou a compor o caminho do artista Alexandre, tendo na visitação dos afetos impressos nas páginas uma espécie de complemento ao trabalho e à investigação do seu eu-ator. Foi, talvez (e ainda seja), como alimentar-se pelas páginas e alimentar os outros com a cena no palco. Hoje, sem o frente a frente com a plateia, ele tenta com a tela, e as suas consequentes limitações, alcançar os enlevos. Com a participação de outro professor de literatura, Renato Moraess (com “ss” no final mesmo), Damascena mantém em dia sua relação com as artes. “Vejo nestas lives a possibilidade de partilhar leituras, pois leio e depois analiso com o Renato e as pessoas podem comentar e fazer perguntas também”, explica ele. Interação. Como entre ator e plateia, mas entre bits e telas brilhando na íris.
Damascena fez da sua trajetória artística um flanar entre as páginas e os palcos - Arquivo pessoal
Há meses ajudando as pessoas a driblar o medo, a angústia e o vazio que são consequências da pandemia, as lives acontecem todas as quartas-feiras às 19h30 no Instagram @cafecommachado. O cardápio é variado e tem atraído pessoas de várias cidades do país. A fome de arte, felizmente, aumentou. E os grandes pratos que Damascena e Renato têm destrinchado são Machado de Assis: (Ideias de Canário; A igreja do Diabo), Guimarães Rosa (Desenredo); Clarice Lispector (O crime do Professor de Matemática); Luis Fernando Veríssimo (Atitude Suspeita; Cornita; Paixões; Regininha ou Os Três Dias do Condor etc); Lima Barreto (O Homem que Sabia Javanês); A Nova Califórnia).
Em agosto, os dois fazem leitura e debatem Nelson Rodrigues. Na semana passada, foi “A Dama do Lotação”. Nesta quarta (26), “Os Noivos”.
Sobre alcançar uma média de 30 a 50 pessoas por live (para muitas delas é um programa imperdível às quartas), Alexandre comenta: “Isso só é possível por causa das redes. É um novo mundo que estou descobrindo por causa da quarentena. Antes disso nunca tinha feito live na vida”. Para quem é inquieto artisticamente, a vida é um eterno descobrir e redescobrir.
Via: O Dia
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